quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Mudança energética e social

Quem passou pelo blackout na semana passada deve ter tentado se informar dos motivos, e visto várias vezes o governo estadual colocar a culpa no federal, e assim por diante.

Quem ficou muito revoltado com a administração petista, tem o direito de ficar também com o mandato malufista do Serra, que começou a fazer obras loucamente na marginal. O problema não é "construir coisas", mas sim construir de qualquer jeito, pra ficar pronto antes do fim do mandato. Ampliação
no sense da marginal Tietê de São Paulo, desastre do rodoanel, problemas no abastecimento de água... Vale lembrar que o fechamento das pontes deixou o povo da zona norte completamente prejudicado para se locomover de um local a outro da cidade.

Toda obra que privilegia carros em SP, em detrimento do transporte público ou ecologicamente viável, tem data de validade curta, e não passa de um tiro no pé pra quem irá a Copenhague discutir metas de redução de CO2, desmatamento etc. Se tiver mais espaço pra eles, terão mais carros, a não ser que se estabeleça limites para eles e, claro, melhore a infraestrutura de transporte público. Não só mais ônibus e corredores para eles, também metrô, trem, teleférico e o que mais existir no mundo de tecnologia urbana para domar o caos.

Ufa! Desabafei meu descontentamento com o sistema rodoviário municipal (leia-se administração psdebista). Mas vamos tratar do assunto mais interessante dessa postagem, que o nomeia inclusive, e diz respeito ao governo federal: o blackout da semana passada.

Passei muito medo naquele dia. Achei que o mundo ia acabar. Algumas pessoas que também estavam fora de casa disseram que perceberam um mundo melhor, com as pessoas se ajudando, se olhando, pegando na mão. Não sei se eu estava numa parte mais frígida da cidade, mas não senti nada caloroso. Senti muita dificuldade pra dividir a rua com carros enlouquecidos. Mas não vou divagar sobre minha experiência pessoal. Por mais que eu quisesse há coisas mais interessantes pra tratar aqui.

Eu me dei mal por uma noite, mas e quem está se dando mal há muitos anos? Ao menos no meu blog eles merecem um espaço, e o terão daqui a pouco. Vejam explicações que vão muito além do binômio FHC-Lula. Com a palavra, o Movimento dos Atingidos por Barragens:

Posição do MAB frente ao Apagão
Movimento dos Atingidos por Barragens


No dia 10 de novembro à noite, pouco depois das 22 horas, ocorreu um apagão de energia elétrica e durou em torno de 4 horas até voltar à normalidade. O apagão atingiu 18 estados, onde SP, RJ, ES e MS o desligamento foi total. Milhares de cidades foram afetadas. Dias antes, o povo brasileiro havia sido informado de que as empresas haviam cobrado indevidamente 7 bilhões de reais nas contas de luz.
Estamos assistindo a um conjunto de explicações e versões que, em grande parte, não revelam o teor e as verdadeiras causas que levam a ocorrer fatos como este do desligamento da energia para milhões de brasileiros.


O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) não quer alimentar o circo estabelecido entre empresas, governos e setores que representam o modelo privatista de FHC e Serra. Eventos como o que aconteceu podem ocorrer e mais do que discutir o fato em si, devemos aproveitar este momento para intensificar o debate para o que nos parece central: a insustentabilidade e o mal que o atual modelo faz para o Brasil e a necessidade da criação de um novo projeto energético e social.
Por isso, nossa posição está dirigida ao povo brasileiro e a todos aqueles setores que estão mais preocupados em construir um Projeto Popular para o Brasil - com soberania energética e sob controle popular - do que com as disputas eleitorais que tendem a ser o principal pano de fundo desta polêmica.
A princípio, o setor elétrico deve ter todas as medidas de prevenção garantidas para que não ocorram estes problemas

NO NOSSO ENTENDIMENTO, A CAUSA PRINCIPAL do apagão É:
1. O modelo energético neoliberal, que privatizou e entregou o patrimônio do povo nas mãos de grandes empresas privadas transnacionais, vai em direção contrária aos interesses do povo brasileiro. Este modelo teve início nos anos 90, principalmente nos governos Collor e FHC, e em grande parte perdura até os dias de hoje;
2. Este modelo transformou a energia elétrica em uma mercadoria com o objetivo principal de extrair as mais altas taxas de lucro tendo como principal forma a negação dos direitos das populações atingidas e a cobrança dos mais altos preços nas contas de luz;
3. Com isso nos distanciamos ainda mais da soberania energética, e ficamos subordinados aos interesses dos grandes grupos econômicos mundiais que passam a tomar as decisões estratégicas e se apropriam do patrimônio público nacional;
4. Todo este modelo é dirigido pelo capital financeiro baseado na especulação, na super-exploraçã o dos trabalhadores e na destruição da natureza;
5. A privatização da energia fracionou o setor elétrico em geração, transmissão, distribuição e em comercializaçã o de energia elétrica, o que torna o modelo menos eficiente e mais suscetível a problemas como ocorreu;
6. A criação de mecanismos como a ANEEL, a ONS e a CCEE, espaços controlados pelas empresas privadas, servindo aos interesses destas;
7. Os privilegiados são os grandes consumidores, setor eletrointensivo[1] exportador, os chamados consumidores livres, que não são mais de 665 empresas (como a Vale, Gerdau, Votorantim, entre outros). Devido aos subsídios que recebem, pagam menos de 5 centavos pelo kw, enquanto o povo brasileiro nas suas residências paga mais de 50 centavos pelo mesmo kw de energia. O povo brasileiro paga 10 vezes mais que as grandes empresas;
8. Chamamos atenção especial que o apagão de 1999 e de 2001 serviram para que através do ‘seguro apagão’ o povo brasileiro pagasse 45,2 bilhões de reais (dados do TCU) nas contas de luz todo mês. Além disto, o pânico de escassez ajudou as empresas e a Aneel justificarem aumentos nas contas de luz (mais de 400% nos últimos anos) e acelerou a construção de novas barragens;
9. Esta lógica instalada no setor elétrico, de extrair as maiores taxas de lucro com o menor tempo possível, faz apressar e passar por cima de normas e procedimentos necessários para o bom funcionamento do setor. Redução de equipes e de quadro técnico, trabalhos terceirizados, trabalhadores mal remunerados, precarização e intensificação do trabalho, redução de exigências ambientais estão entre algumas das várias ações práticas que se pode verificar no dia a dia;
10. Alertamos que os freqüentes erros que estão vindo a público, como o reconhecimento através da CPI da ANEEL dos altíssimos preços cobrados e o escândalo da cobrança irregular dos 7 bilhões a mais nas contas de luz, o reconhecimento de que o estado tem uma enorme dívida social com o povo que foi expulso pela construção de barragens e o atual blecaute são fatos reveladores das enormes dificuldades enfrentadas pelo atual modelo.

Nesta situação, propomos:
1. Deve-se paralisar imediatamente o processo de privatização do conjunto do setor elétrico;
2. O governo e o estado devem reassumir imediatamente o seu papel no controle da energia elétrica para que possamos caminhar rumo a um projeto com soberania energética e popular;
3. Deve-se investir prioritariamente para que todos os processos de produção, distribuição e uso de energia sejam pautados por uma política de racionalidade, conservação e economia de energia;
4. Devemos caminhar para que a energia atenda, em primeiro lugar, aos interesses vitais do povo brasileiro e, portanto, devemos combater o modelo eletrointensivo exportador de energia, que nada trás de benefícios ao nosso país;
5. Exigimos imediatamente a redução dos preços da energia elétrica e a devolução dos 7 bilhões de reais ao povo brasileiro;
6. Exigimos o cancelamento de projetos, como a Hidrelétrica de Belo Monte, que vai penalizar o povo brasileiro e a Amazônia para beneficiar meia dúzia de empresas transnacionais;
7. Exigimos o imediato pagamento da dívida social que o estado brasileiro tem com as populações atingidas por barragens.

Por fim, reafirmamos que "água e energia, não são mercadorias" !

São Paulo, novembro de 2009.
Coordenação Nacional do MAB


[1] Eletrointensivo é aquele cujo valor da energia elétrica utilizada represente mais de 25% (vinte e cinco por cento) do custo da mercadoria produzida. Central na produção de aço, alumínio, cimento e metalurgia, entre outros.