sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Sem nenhuma importância

Sexta feira
Algum lugar da Cidade Universitária

Geralmente sento mais na frente nos ônibus da vida, mas hoje, exepcionalmente resolvi sentar atrás, em um dos últimos cinco lugares - que eram mais altos do que os anteriores, por se tratar de um veículo com o meio rebaixado (esse detalhe é bem inteligível para a maioria dos leitores do meu blog, acredito). Na cadeira da frente tinha um homenzarrão/ um viking alto e loiro, de pele queimada. Não o achei bonito, não o achei feio, não sei se xingava a mãe, se fazia filantropia. Só lembro da mecânica do movimento que repetiu durante os metros em que convivi com ele/ tirava do bolso, enrolava com o indicador e o polegar e atirava as bolinhas formadas em dois garotos que estavam mais pra frente, na fileira oposta.
Inicialmente pensei que se tratava de um retardado, talvez tenha olhado até com alguma compaixão para o pobre diabo. Mas quando, em um certo ponto, subiu um sujeito e se pôs a prosear com o nosso protagonista, meu novo julgamento passeou entre serelepe e revoltado, infantil e vingativo.
E depois pensei que aquele cara de meia idade, jogando papéisinhos x em moleques, fazia tanto sentido quanto eu estar onde estava, dirigindo-me para onde me dirigia.

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Ao escrever sobre o amigo crianção/frustrado, impossivel nao imaginá-lo (mesmo na hora em que o vi) personagem de fábula, de algum conto europeu - daqueles que eu lia quando criança. Sempre tinha a menina de cabelos cor-de-cerveja e lábios botão-de-rosa, o velhinho maldizente que lançava pragas aleatórias, e vez por outra, um homem (quase sempre jovem) forte ou medroso ou vaidoso ou egocêntrico ou valoroso ou fanfarrão ou preguiçoso ou idiota. Idiota.
Esse não foi o único personagem errante que encontrei esses dias.
Acreditem ou nao, ontem, entrando no metrô, cruzei com um velho marujo tentado, ridiculamente, se disfarcar em roupas contemporâneas.
Aquele olhar azul torto inconfundível, de quem passou a maior parte de seus anos enrugando a testa por causa do sol, a toca curta mal posta na cabeca - um vício antigo que nao faz nenhum sentido nessa cidade-, o cachimbo pendente da abertura seca da cabeca (esse, assim como os outros, não tinha belos labios carnudos. nem faria sentido se os tivesse) se formando, ganhando cor, vida naquele corpo salgado.
Não, não era um simples mendigo. Era um velho lobo do mar que se aposentou e tentou viver como o resto do formigueiro.
É claro que nao conseguiu.



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9 comentários:

Murilo disse...

Puta que pariu! É disso que eu to falando! (piada interna, ia rir no momento)

Meus parabéns Lia! uma bela história cheia de comparações saudáveis. (pobre diabo foi o clímax)

Lia, to prescisando de um favor, pega uma gaita e uns óculos escuros e corre aqui. A semana foi cheia de azar, quase uma epopéia de graças. Dai to pensando em cantar uns blues.

Sem mais, beijos mil!

Lia Lupilo disse...

pobre diabo soa muito como você.
sim, acho que você me influenciou para algo mais inventivo,
apesar de não se tratar apenas de escrito,
eu realmente vi aquele pirata velho.

e pode deixar que tô colando aí à tarde ,-]

=0***

ps: obrigada!
ps2: é claro que depois você vai me contar a piada interna

Pedro Sibahi disse...

Hey! Hou!
E uma garrafa de rum!

Pelo menos ele se diverte jogando papel em mulekes metidos pq estudam na USP...
e vc se diverte assistindo! Ahhh!

Aline disse...

fantástico :]

sua imaginação criativa sempre me encanta...

ei,vc falou ou não com seus pais sobre aquilo hein?! hun,enrolona..
já basta me dar o bolo no dia do almoço....

saudades,bjos!

dcs disse...
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dcs disse...
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Bruna Escaleira disse...

Às vezes tenho a impressão de que todos os habitantes desse 'formigueiro' são personagens excêntricos

e os ecanos então?

adorei a história!

Beijos, Liaseca!

Camila disse...

"daqueles que eu lia quando criança"

Daqueles que você-você quando criança. hahahhahah

Mals, foi inerente à minha imaginação.

Pedro Sibahi disse...

Lia, você eh uma autoritária!
fica deletando os comentários!
reclamo e olha q nem eram meus!
:P